Lélia Gonzalez

Lélia Gonzalez em imagem sem data. Segundo a amiga Ana Maria Felippe, era uma das fotos de que ela mais gostava. Foto: Acervo Pessoal.

 

Nasceu em Belo Horizonte em 1935, filha de Acácio Joaquim de Almeida, ferroviário, e Urcinda Serafina Almeida, empregada doméstica. A família se transferiu para o Rio de Janeiro quando Lélia tinha sete anos, instalando-se na favela do Pinto, no Leblon, bem perto do Clube de Regatas Flamengo, onde seu irmão, Jaime de Almeida, seria jogador de futebol e depois técnico.

Em sua formação escolar, Lélia investiu numa formação acadêmica humanista, fazendo graduação em história, geografia e também filosofia na UEG (antiga Universidade do Estado da Guanabara do Estado do Rio de Janeiro). Iniciou os estudos de pós-graduação atuando como docente no Instituto de Educação no Colégio de Aplicação (UERJ), na Universidade Gama Filho e no IFCS (Instituto de Filosofia e Ciências Sociais) da UFRJ. Mas sua participação acadêmica mais destacada foi como professora na PUC-RJ, chegando a chefiar o Departamento de Sociologia.

Depois de seu matrimônio com Luís Carlos Gonzalez - quando tinha 28 anos -, assumiu o sobrenome Gonzalez. Já nos anos 1970, manteve uma intensa participação nos debates políticos e públicos sobre gênero, lutas feministas e organizações antirracistas. Filiou-se a várias organizações negras, como IPCN (Instituto de Pesquisas das Culturas Negras), MNUCDR (Movimento Negro Unificado contra a Discriminação Racial) e Coletivo de Mulheres Negras N´Zinga, entre outras. Atuaria também em partidos políticos, sendo candidata a deputada federal (pelo PT, em 1982) e deputada estadual (pelo PDT, em 1986), ficando como suplente. Sua presença foi fundamental na ampliação dos debates sobre a questão racial no período da redemocratização.

​Entre seus vários textos, destacam-se “Racismo e sexismo na cultura brasileira” (1983) e “A categoria político-cultural de amefricanidade” (1988). Com Carlos Hasenbalg - sociólogo argentino, estudioso das desigualdades raciais no Brasil - publicou ainda Lugar de negro (1982).

No início dos anos 1990, Lélia se transformou numa referência incontornável na organização de mulheres negras e também na formação acadêmica feminista negra. Depois da sua morte, em 1994, sua presença crítica, antirracista, não cessou de aumentar, com seus textos sendo publicados e ganhando grande alcance, e seu nome batizando uma escola pública estadual do subúrbio carioca, coletivos negros universitários, blocos afros, peças teatrais e prêmios literários.

Reunião do Instituto de Pesquisa das Culturas Negras (IPCN), 1986. Foto: Januário Garcia.

Estamos cansados de saber que nem na escola nem nos livros onde mandam a gente estudar se fala da efetiva contribuição das classes populares, da mulher, do negro e do índio na nossa formação histórica e cultural. Na verdade, o que se faz é folclorizar todos eles. E o que é que fica? A impressão de que só os homens, os homens brancos, social e economicamente privilegiados, foram os únicos a construir este país. A essa mentira tripla se dá o nome de: sexismo, racismo e elitismo.
— Lélia Gonzalez
Mas o ponto mesmo emblemático para mim, na trajetória que fiz como militante, foi quando eu vi pela primeira vez a Lélia Gonzalez numa palestra na Biblioteca Municipal de São Paulo. Porque a Lélia veio resolver o pedaço que faltava em toda efervescência desse debate, e que era fundamental para a minha experiência pessoal, para minhas inquietações: como pensar a questão de gênero, a questão específica da mulher negra no contexto da luta racial? E quando eu ouvi a Lélia, parecia que ela estava dentro do meu cérebro organizando tudo o que me inquietava, tudo o que eu sentia, que eu não conseguia formular. Parece que ela botou ordem na casa. E a partir daquele dia eu sabia perfeitamente o que eu iria fazer: construir a minha militância articulando as duas questões, de gênero e raça.
— Sueli Carneiro, no livro "Histórias do movimento negro no Brasil, Depoimentos ao CPDOC."

Sueli Carneiro: Filósofa, doutora em Educação pela Universidade de São Paulo; coordenadora executiva de Geledés Instituto da mulher Negra; coordenadora da área de Direitos Humanos de Geledés; editora do Portal Geledés e coordenadora do Projeto PLP 2.0 aplicativo de combate a violência contra a mulher vencedor do Desafio de Impacto Social Google.

É também diretora vice-presidente do Fundo Brasil de Direitos Humanos. É ativista do Movimento Feminista e do Movimento Negro do Brasil; autora de artigos sobre gênero, raça e direitos humanos em diversas publicações nacionais e internacionais.

 

Referências

Enciclopédia negra / Flávio dos Santos Gomes, Jaime Lauriano e Lilia Moritz Schwarcz. – 1ª Ed. – São Paulo: Companhia das Letras, 2021.

Histórias do movimento negro no Brasil Depoimentos ao CPDOC / Verena Alberti, Amilcar Araujo Pereira. Pallas Editora, 2016.

 
 
Carlos Ferreira

Dedicado a organizar e transformar dados em informações. Desde a infância, conectou-se com a história afro-brasileira por influência familiar e ampliou essa conexão através de pesquisas e experiências com o samba.

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